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quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Uma solidão solteira

Li esse texto no blog da Lu Brasil (www.lubrasil.net), que eu persigo no twitter (@lubrasil).
Nada do que li descreve com tanta precisão as delícias e, especialmente, as agruras do que é ser mãe. Pelo menos, até aqui.

UMA SOLIDÃO SOLTEIRA
por Fabrício Carpinejar (www.fabriciocarpinejar.blogger.com.br)

O que é ser mãe? É nunca precisar responder a essa pergunta. Diferente de pai, que sempre se explica e gosta de se explicar. Mãe parece que nasce sabendo, não importa a idade, não importa a disposição. Julga-se como um dom natural e um desejo de vida, desde o momento em que brincava de boneca na infância e formava uma família imaginária no quarto. Que menina, quando pequena, já não sonhava em trocar a roupa do filho ao vestir e desvestir sua Barbie? Ser mãe não é encarado como profissão nem deve, mas é tão estafante quanto um início de carreira. O papel é visto como prazer e dádiva. Para alguns homens, é reconhecido como o cumprimento de um ideal. Um sonho. Mas não significa que será fácil. E não é. Responde a um dos períodos de maior aprendizado, nervosismo e tensão. Durante a gravidez, a mulher se multiplica. Espiritualmente é duas. Ganha atenção dobrada. Seus pedidos mais estranhos são atendidos. Cavalheirismo e educação exagerados batem à sua porta. Não me refiro aos assentos vermelhos do ônibus e do metrô e dos guichês do banco, reservados a gestantes. Muito além disso: abrem-se os caminhos do entendimento e da cordialidade. Ela encontra uma paz de bosque, uma quietude social. Não é contestada, criticada, desafiada. Nada que prejudique o andamento da gestação. Sua fragilidade a ilumina de carícias.

DEPOIS DO NASCIMENTO, desconfia de que sua barriga serviu para um aluguel de luxo, que os familiares se importavam com a criança a vir, não com a criança adulta que se transforma em mãe. Paparicam o bebê e ela acaba de canto, alheia, sequiosa por um aconchego que não chega. Na hipótese de atravessar uma cesariana, dolorida e custosa, não receberá sequer algum questionamento sobre sua saúde. Andará sozinha, bem lenta, atrás do cortejo. A depressão pós-parto não é uma miragem, sinaliza desvalia.

De uma hora para outra, a mulher não é mais responsável pela sua existência, é responsável por duas vidas. Não poderá se dar ao luxo de pensar somente em si. Pensará em si por último, caso sobre tempo. Aliás, vejo que não é casando que a mulher deixa de ser solteira, ela muda efetivamente de estado civil ao gerar um filho. A dependência é substituída pela independência, no sentido de orientar e educar a criança.

POR MAIS QUE ESTEJA ACOMPANHADA de um marido companheiro e atento, é como se mandasse no campinho. É ela que deverá responder - ou acredita que deve responder - no surgimento de dúvidas e impasses. O homem ainda goza da regalia de coadjuvante, com atenuante de que não precisa conhecer tudo. Pai está aprendendo a ser pai, mãe está ensinando a ser mãe. A crença é que a mulher tem uma enciclopédia embutida no ventre.

Licença-maternidade não é uma licença poética. Não é apenas estacionar o filho na vaga preferencial do seio. Mal se recuperou do parto e enfrenta a multiplicidade de atividades. Não dorme pelo medo de dormir e deixar escapar um apelo do bebê e ser incriminada por omissão. A insônia é o de menos. Até encontrar a posição certa de segurar o nenê para não ter cólicas, até encontrar a melodia adequada que tranqüiliza o choro, até encontrar a postura confortável para não sofrer com dor nas costas, é uma arte.

ENTRE CUEIROS E TIP-TOP, entre fraldas e lençóis, dificilmente será reconhecida em família pelos seus pequenos e imprescindíveis feitos. De que modo contar a terceiros e ao próprio marido o que fez? Que deu leite, arrumou as roupas, limpou o cocô, deu papinha e que essas operações tomaram o seu dia? As energias gastas em 24 horas serão reduzidas a um relato de três minutos. Dirão que é exagero. Começa a cobrança e a sensação de que não é compreendida.

O marido aparecerá em casa, leve e lépido, mais disposto (é claro), e brincará descansado com o filho, imitará sons de bichos, desfrutará da organização e de uma companhia para dividir as tarefas. Ele curte o que desejava para você. O pai é o parque, a mãe é dia útil. Resta assistir à alegria como se fosse sua.

IMAGINE UMA PROFISSIONAL HIPERATIVA
mergulhar de repente nesse mundo em que nada aparenta acontecer e tudo acontece sem jeito de demonstrar? Ter a rotina reduzida a dez quarteirões do bairro, na faixa que compreende a quitanda, a farmácia, a praça e o mercado, como um exílio em sua cidade? Uma mãe recente é uma ótima crítica da televisão à tarde. Pela primeira vez, é capaz de opinar com fundamento sobre a qualidade dos programas.

De um comercial a outro, o filho cresce mais rápido do que supunha. O que adiava para fazer continuará adiando. Se nos preparativos, demorava séculos para definir a cor do enxoval, as decisões agora são rápidas e fulminantes. São para ontem. O filho largou o peito, deve então acertar a temperatura do leite, preparar a comida, optar pelas peças da gaveta. Será que ponho casaco ou não? Está quente ou frio? O ponto mais visitado é a bunda rosada da criança, para verificar assaduras. As mãos cheiram a hipoglós e não é de estranhar que a pasta branca fique nos vãos dos dedos no momento de dormir. E, quando toca o telefone, a mãe se envergonha de dizer que está segurando o filhote no colo e faz o impossível para que a voz na linha não note o incômodo. Um malabarismo para acalmar os gritos do pequeno, entender a conversa e ser educada. Mãe carrega muita culpa desnecessária. A maternidade é uma solidão desproporcional, uma solidão solteira em cama de casal.

A libido fica em baixa, não se tem a mesma vontade louca de transar. Nem é vontade, é disposição, condicionamento físico. Após desbotar o tapete do corredor no vaivém, não há como se arrumar. Arrepende-se dos espelhos no quarto adquiridos para projetar posições eróticas. O homem se aproxima dengoso e amoroso e a dor de cabeça é a saída menos explicativa. Existe um cansaço inclusive para DR (Discutir o Relacionamento).

A mulher se vê acima do peso, com os seios estranhamente grandes (talvez o homem goste da protuberância, esquece que o aumento é inchaço, dói e não é para ele) e a cintura se equilibrando com a transformação. Pela primeira vez, um maiô não é uma idéia insuportável. O corpo está longe da rigidez e para recuperar as formas antigas só com muita ginástica, musculação e sorte.

ELA ESTÁ DISTANCIADA DO NÉCESSAIRE, substituída pela sacola forrada de plástico, com pomadas, panos, bicos e o restante infinito do arsenal infantil. O máximo a fazer é paquerar a sinaleira. O único jeito de avançar no sinal vermelho é ali, com o carrinho de bebê na faixa de segurança.

Se não está aprontando e ordenando as coisas, está limpando a bagunça. Se não está encaminhando a criança ao sono, está dormindo junto. O banho de banheira da criança que encharcará o piso será o raro momento em que se ausentará, ouvirá novamente sua respiração e buscará informações atualizadas da rua.

Falei do trabalho, porém é o isolamento que mata. O pai age, na maioria das vezes, como um porteiro das visitas, cumpre a convenção social de mostrar o bebê para em seguida continuar suas conversas. Um elogio pra lá, um elogio pra cá, a criança abandona a cena e a mãe corre atrás, para atender as chamadas noturnas. Não há como acompanhar os papos entusiasmados e eufóricos. Escuta-se as risadas do quarto, com receio de que a criança seja acordada e tenha que recomeçar o acalento. Torce para que as visitas saiam cedo.

OS AMIGOS E AMIGAS DA MULHER, de contato freqüente, de repente desaparecem. No início, podem rodear o bebê, propor bilu-bilu e esganiçar dublagens. Exaltam o nascimento. No instante do socorro e exaustão, nenhuma alma por perto. Acontece uma segregação silenciosa e terrível. Alguns se afastam para não incomodar, outros para não serem incomodados.

Durante essa fase, os relacionamentos escasseiam também devido à exclusividade materna. Quem não tem filho pode achar esquisito, mas pais discorrem na mesa sobre quantas vezes a cria foi aos pés e a cor das idas e vindas! Ela encontrará dificuldade de conversar de outros assuntos que não os relativos ao seu filho. Afinal, seu universo gira em torno dele. Vai se aproximar de outras mães para dividir suas dores e delícias. Um dos motivos para que as reuniões das creches sejam longas. É um momento de desafogo e de cumplicidade.

A MÃE QUER SE SENTIR OUVIDA, falar do que incomoda na hora em que sente. Não depois quando já se confortou. Ou antes quando não entende. Tal jornal – mãe é para ser lida no dia. A pior coisa para ela é estocar sentimentos e apreensões, como quem guarda inutilmente papel velho. Mãe deve dizer o que a confunde de pronto e ser respeitada em silêncio até o fim, para que a preocupação não seja convertida em recalque.

Quando não está ao lado da criança, mãe padece com severa intensidade. Uma saída para se distrair – ou ao retornar ao trabalho –, e está ligando apavorada para a babá, solicitando relatos minuciosos dos últimos movimentos do rebento. Pavor de que não há quem cuide melhor do que ela. Ou pavor de que alguém cuide melhor do que ela.

O QUE É SER MÃE? É nunca precisar fazer essa pergunta. O que se experimenta em segredo, o esforço hercúleo, o afeto pontual serão recompensados com a telepatia. A mãe notará que é possível esconder seus sentimentos de qualquer um, menos de sua criança, que alisará seus cabelos no desalento com o pente das unhas e nadará com alegria em seu corpo em cada abraço. E basta observar que a criança imita seu trejeito, basta reparar que a criança segura os objetos com a sua firmeza, basta reconhecer na voz dela o galho florido de seu timbre, basta cheirar o cangote e descobrir quantas fragrâncias não foram criadas, basta vê-la caminhar longe do apoio, balançando como um pingüim, basta ouvi-la dizer “mãe” com a pausa de uma reza, basta ser surpreendida com as repetições de suas idéias, basta que ela invente novas possibilidades para linguagem, basta que ela ponha a digital em um cartão, que ela retribua o “eu te amo”, e as adversidades serão esquecidas. As adversidades já serão amor.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Calor no coração

Aberta oficialmente a temporada de veraneio 2009/2010. E, a despeito de todos os contratempos, consegui das um pulinho na praiuca. Ainda não rolou aquele banho de mar, mas só sentir o cheirinho, dormir com o barulhinho já foi uma delícia.
Foi também o primeiro passeio da Valentina à beira-mar. Pelos pulinhos e gritinhos do carrinho, ela adorou. Foi um encontro tímido, com trocas de acenos à distância, com um misto de curiosidade e receio daquele estranho super charmoso.
O lugar pra onde fomos é especial. Foi cenário de muitas descobertas e experiências da minha infância, de muitos encontros e desencontros e reencontros da minha adolescência. Pude, enfim, apresentá-lo à minha filhota. Tomara que ela aproveite tanto quanto eu.
Vem chegando o verão...

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Minha princesa

Gatinha!

Faz um ano que chegaste, meio de sopetão, em carne, osso e fofura, na minha vida. Um ano. Desde então, eu não sou mais a mesma. A cada dia, me ensinaste alguma lição. A cada dia, um novo encantamento.

Acompanhar as tuas descobertas, apoiar tuas experiências, observar teu sono, escutar a tua risada mais gostosa – tudo isso faz mais feliz a minha vida, dá sentido aos meus dias, dá força frente a quaisquer dificuldades e me garante que ser feliz é bem mais fácil do que parece.

Por tua causa, sou uma mulher melhor, uma filha melhor, uma cidadã melhor. Contigo, descobri o que é o amor, essa força que enche meu peito, se esparrama pelos meus poros e contamina cada uma das minhas células.

Amo tua carinha sonolenta, teu cheirinho quentinho quando sai da cama, teu andar ainda vacilante, tuas mãozinhas gordinhas curiosas, teus pezinhos ligeiros, teu olhar esperto, teu sorriso de poucos dentes, a tua pele macia. Amo estar contigo, brincar contigo, aprender contigo, crescer contigo.

Sou muito feliz por ser tua mãe. Sou grata a Deus por ter te colocado na minha vida, a minha valente menina que decidiu nascer, sim.

Valentina, minha filha: É teu aniversário e tu és o presente. O meu melhor presente.

Parabéns, minha bonequinha, minha florzinha, minha gatinha mais linda.

Te amo muito e sempre.

Beijocas estaladas da tua mamãe.

Marla

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Uma odisséia literária

Livros à esquerda e à direita. Livros à frente e ali atrás. Grandes, pesados, pequeninhos, baratos, caros. Todos livros. Todos encantadores. Deixei Valentina com o papai e passei o fim de semana enfurnada na 55ª Feira do Livro de Porto Alegre. Nem mesmo o temporal do sábado, que espantou os compradores e chegou a molhar livros, derrubou meu bom humor.

Essa atmosfera literária é fascinante. Os escritores invadem a praça, os leitores se aboletam nas tendas e eventos paralelos. Em uma saudação viva à cultura!
O adorável da Feira é como é democrática. Pra começar, não se paga ingresso. É possível circular por ali, olhar tudo, encontrar todos e não gastar um só tostão. E se não resistir à tentação, o andante encontrará obras para todos os bolsos e gostos. Tem crônica, poesia, romance, livro técnico; livro infantil, juvenil, adulto, pra mulher, pra homem – sei lá se existe isso essa divisão, but...

O cenário não podia ser melhor, com aqueles prédios centenários e jacarandás floridos. As pinturas do Margs, a história contada no Memorial, as artes se encontrando no Santander Cultural, os salões do Clube do Comércio abrigando oficinas e debates e prêmios.

Claro que não resisti e comprei vários títulos. Uns para introduzir a leitura na realidade da minha pequena, outros para eu mesma resgatar o hábito. Peguei autógrafos, conversei com autores, fui até mestre de cerimônia de um lançamento – minha estréia! Três dias que valeram cada segundo.

Hum, quando começa a 56ª?!

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Um dia de "mothern" - casamento na família

Sexta-feira, 2 de outubro, 7h30. Hora de pular da cama, "pelo menos, tem sol e está menos frio" é o estímulo. Tomar café, escolher a roupa, vestir, maquiar. Hum, um murmúrio no quarto: Valentina acordando. Muitos beijinhos e conversinhas pra ajudar a acordar. Escolher nova roupa - a de ontem à noite é quente demais pra hoje -, tirar o pijama, mais beijinhos e conversas, dá a mão aqui filha, depois tu pega o brinquedo. Vestir o resto da roupa. Filha, larga o brinco da mamãe, isso machuca. Toma o mamazinho de café da manhã, cadê a mochila, minha bolsa está aberta, droga! despencou tudo no chão. Descer os três andares de escada em cima do salto, equilibrando bolsa, muchi, Valentina e o celular, que quase fica pra trás, mais chaves de casa, do carro e controle remoto do portão. Prender a mocinha na cadeirinha, não filha, não é pra ir em pé, toma o brinquedo pra te distrair. Deixar a moça na creche, depois de muitos beijinhos mais.

Trabalhar, escrever, mandar e-mail, atender telefone. Obrigada, Marilyn, pelo anel, vai ficar lindo com o resto na festa. Conforme combinado com o chefe, working só até meio-dia. Opa, esqueci a bolsa da Marilyn lá em cima, Déa me alcança pleeease. Passada no banco para trocar o cheque - não, senhora, não é nessa agência, tem que ser na da sua conta.

Busca a mãe no salão, com o almoço embaixo do braço. Almoço, telefonema com a cunhada, sim, querida, te empresto um bolerinho, lá é frio. Uhu, 2016 é nosso. Deixa a mãe no salão, passa no banco, passa na Assembleia, não Fe, não dá pra te esperar, achei o brinco na gaveta, vai ficar lindo, depois mostro fotos. Droga, esqueci a necessaire de maquiagem no trabalho, volta lá, Déa me salva de novo!

Passa em casa, um banho rápido, mas com cremes e óleos pra pele estar bonita à noite. Camisa para não estragar o cabelo depois. Cunhada, quer carona?! Ah, já foi pro salão, tudo bem estou indo. 15h30, cabelereiro. Ele se atrasa dez minutos, será que fará falta?! Fofocas no salão, irritação com mensagens recebidas. Calma, não vamos estressar as celulazinhas neste dia importante. Ficou ótimo o cabelo! Abastece o carro, já na reserva, onde acho uma blusinha pra Valentina pôr embaixo do vestido?? Desculpe senhora, neste modelo, tamanho só RN. Na outra loja, segunda pele com rendinha na manga, perfeita. Ai, não dá pra dirigir encostada senão estraga o cabelo!

Em casa, um chimarrão enquanto maquia, droga! pq um olho não quer ficar igual ao outro?! Sai, maquiada mesmo, pra buscar Valentina na creche. Não filha, não puxa o cabelo da mamãe. Chegando em casa, janta da mocinha antecipada pra evitar fome durante a cerimônia. Vamos tomar um banho gostoso?! Nãããão ,não joga água pra cima da mamãe! Deixa mamãe pôr a meia-calça, tá fresquinho na rua, pega a pomada pra brincar. Põe blusinha nova, vestido e sapato vermelho fofo, está linda. Senta no andador pra não se sujar, ó o brinquedinho!
Termina a maquiagem, põe o vestido, Valentina, não tira o sapato! Bolerinho de manga curta dá conta da temperatura, mas não combina com o colar. Leva o mais quentinho no carro, pra se a temperatura mudar. Está ótima, passa perfume, coloca o sapato de salto. Filhinha, vamos pôr o bolerinho vermelho combinando, não tira o sapato! Imprime o mapa, pra não errar o caminho, cadê as folhas brancas dessa impressora?! Leva mamadeira de água, fralda e lenço na mochila do Backyardigans, que já é brinquedo. Ok, hora de sair, cadê a droga do sapato da guria?!?!?! Desce devagar, pra ninguém cair.

Chega no carro, não vou poder ir dirigindo, mãe, Valentina vai mamando. Onde é a igreja? pergunta pra esse moço aí. Ufa, 20h10min chegamos a tempo. Hora de curtir as emoções do casamento da Dai.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Caras e bocas: o bolo desandou

Análise interessante sobre essa novela, que tinha tudo para ser diferente e acabou igual a todas as outras...

Caras e boas e um bolo abatumado
Por Marcelo Spalding

Há anos que uma novela não conseguia me prender por mais de trinta minutos na frente da TV. E não foram poucas as tentativas: os tentáculos são longos e em qualquer jantar na casa da mãe ou da sogra, em qualquer festinha familiar lá está ela, plim-plim, com os choros e gritos de sempre.

Mas Caras & Bocas me pareceu diferente. Não porque a pintura seria o mote, mas porque de certa forma me cativaram os personagens, especialmente as crianças, e um bom personagem faz toda a diferença. Não estou falando do choramingo da mocinha Dafne (Flávia Alessandra), nem das maldades calculadas de Judith (Deborah Evelyn), mas ao redor do nhemnhemnhém havia a graça cáustica de Bianca (Isabelle Drummond) em contraponto ao desajeitado Felipe (Miguel Rômulo), um judeu (vivido por Sidnei Sampaio), uma menina cega (Danieli Haloten), famílias de negros e um macaco. Ou seja, todos os ingredientes para que se abordasse o preconceito racial, étnico, com os deficientes, os pobres, os velhos, de forma leve mas inteligente.

Infelizmente, porém, os ingredientes são muito melhores do que o bolo. Ou as tintas muito melhores que o quadro. A novela repete velhas fórmulas surradas e esgotadas, um maniqueísmo estúpido que associa bondade à burrice e maldade à esperteza, insiste em gracinhas repetitivas e não avança nas questões centrais. Pelo contrário, reforça estereótipos e preconceitos.

Vejamos alguns casos:

Benjamin, o judeu ortodoxo, dono de joalheria, é confrontado com as mil maravilhas do "nosso" mundo, inclusive uma estonteante mulher de cabelos vermelhos e pra lá de oferecida. Sua mãe, sentindo a tentação, arranja uma noiva ortodoxa e puritana, mas igualmente bela e loura e de olhos azuis. Benjamin fica balançado, e não se sabe o que vai acontecer. Mas importa? Já estão ali todos os estereótipos, o judeu é o careta (e rico), a mãe é a superprotetora, a noiva é uma ariana boba e a outra, esperta e sensual. Aposto que, se o público pudesse escolher, mataria a mãe.

Bianca, a princesa da novela, filha da rainha-protagonista, ganha a cena quando aparece com o inseparável Felipe, filho dos empregados da casa. Pobreza, para ela, é a treva. E repete o bordão a todo momento, com graça e ensaiada hipocrisia. Claro que de tanto repetir e vindo de uma atriz tão talentosa (ex-Emília), a ironia fica evidente, mas não há ninguém na história para dizer a ela o contrário, nem o amigo pobre jamais a deixou por isso. Parece que não há riscos em se odiar pobres e pobreza, apenas vantagens, o que está, vamos combinar, muito longe da realidade.

No núcleo pobre, aliás (não sei quem inventou essa história de núcleo nas novelas, é todo mundo rico ou pobre, ainda que pobre seja modo de falar), há outro romance interessante, do garçom Anselmo (Wagner Santisteban) com a menina cega Anita. Anselmo, com medo que Anita o rejeite, finge ser um milionário, e em diversos diálogos com a dona da pensão onde mora é humilhado não porque deveria falar a verdade e superar as barreiras, mas porque não tem condições de sustentar uma moça cega. Como assim? Quer dizer que um rapaz honesto não pode namorar uma cega apenas porque é garçom??? Provavelmente acabarão juntos, para a catarse popular, mas fico imaginando os milhares de jovens garçons, cobradores de ônibus ou lixeiros vendo a novela e pensando em seus sonhos de progredir, ter uma família, uma casa.

Ada (vivida por Amanda Azevedo), é a criança do "núcleo pobre", não por acaso negra. Uma graça de menina, desenvolta e de olhar vivo. Filha de pais trabalhadores, sonha ser dançarina e está sendo treinada pela dona da pensão, que nas horas vagas a faz ir com Anita, a cega, até a frente do restaurante ajudá-la a vender rosas. Claro que sem os pais dela saberem, afinal de contas a menina é bonitinha mas é negra, e bem pode ficar de pé vendendo rosas mesmo que em casa tenha comida, calor e afeto dos pais.

Na verdade, no bairro tem outra criança, o quase adolescente Espeto (David Lucas), sósia do Harry Potter, filho de Denis (Marcos Pasquim) e amigo do macaco. Aqui fica evidente o tipo de valores transmitidos por novelas como essa: o pai, pintor fracassado, um dia descobriu um macaco que pinta e alguém que se apaixonou pelas obras, prometendo fama e dinheiro. Com a ajuda do filho, fazem de tudo para que o macaco não seja descoberto e continue pintando. A pose do galã é de quem tem peso na consciência, mas sempre incentivado pelo filho (e criança pode tudo, não é mesmo?), mantém o plano e sabe-se onde vai dar. Também não importa: o fim justifica os meios.

E nem as mulheres, público sempre fiel das telenovelas, estão a salvo: quando não são bonitas, estão fadadas ao fracasso - Ísis (Carina Porto) -, e quando o são, devem arrumar um marido que traga mais vantagens possíveis. Aliás, é isso que faz a protagonista o tempo todo, arrumar alguém para casar a fim de herdar ações e dinheiro, e também Simone (Ingrid Guimarães), a amiga, e Milena (Sheron Menezes), a filha da empregada.

Aliás, no último capítulo que assisti antes de escrever este texto, Milena foi vítima de mais uma armadilha da malvada caricata Judith, que fez todos acreditarem que a menina roubara um anel. O dono do restaurante, sem pestanejar, chamou a menina e revistou sua bolsa. Claro que encontrou a peça lá, e todos, inclusive os garçons, acreditaram imediatamente na versão do roubo. Afinal, ela é negra, fica mais fácil associar o roubo a uma negra. E mesmo que a sinopse afirme ser ela "bonita e íntegra" e ter "orgulho de ser quem é, de seus princípios e valores", caiu facilzinho na lábia do riquinho malvado Nicholas, seu pseudonamorado, não por acaso branco (não sei por que nunca apareceu sendo cortejada por alguém mais próximo a ela, mesmo sendo realmente bonita, como se homens "comuns" não a interessassem, apenas filinhos de papai).

Enfim, é interessante observar como é difícil mudar uma visão de mundo construída há tanto tempo e com tanto cuidado pela plim-plim, onde o que impera é o consumo e as relações sociais nada mais são do que convenções e interesses de um lado, paixões descabidas e eternas de outro. Num mundo assim, os personagens são todos planos, sempre bons ou maus, sempre a favor ou contra a rainha, e a rainha é sempre linda e rica e loura. Até porque o resto, é a treva! E o que interessa, mesmo, é o horário comercial.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Amor como remédio

Do blog Meu Filho (zerohora.com).
"Uma criança com privação de afeto adoece mais. O mecanismo é conhecido: o estresse da insegurança de não ter cuidadores confiáveis, psiquicamente presentes, abala o equilíbrio funcional, e o organismo fica mais suscetível a todo tipo de ameaças. Um dos sistemas que mais sofre é o imunológico, que nos protege contra tumores e infecções.
Não é incomum a tentativa de compensação da incapacidade de prover afeto através da utilização repetida dos serviços de saúde. Salvo casos específicos, aquela criança que vive no médico é forte candidata a estar sofrendo de falta de amor.
O problema é frequente. Um dos locais onde mais se vêem as consequencias da pouca atenção aos filhos é no consultório clínico e psiquiátrico. Muitos pais ingenuamente colocam o dinheiro, os cuidadores profissionais, a patinação, a natação, o futebol, o inglês ou as reprimendas onde deveria estar o amor.
Muitas depressões e queixas de "mau comportamento" desapareceriam diante de um gesto de compreensão ou com um sincero elogio. A criança que precisa de "limites", conceito tão na moda, na verdade está sofrendo. Se ela for amada e entendida, bastará orientá-la.
Concordo que é mais fácil falar do que fazer. Os próprios pais muitas vezes não estão preparados para dar amor, porque eles mesmos não o receberam em doses suficientes. São secos, porque sempre foram tratados secamente, por mais que disfarcem isso com aparências de afetividade. O amor não é abstração romântica, mas se expressa por atos concretos.
Levar o filho para comprar um tênis, brincar com ele, reconhecer seus progressos, evitar a crítica desmoralizante (todos têm o santo direito de fracassar e de aprender com a experiência), ter paciência, dar um telefonema-surpresa no meio do expediente, não mexer nas suas coisas, alcançar um travesseiro enquanto ele assiste TV, deixar dormir até mais tarde no fim de semana, são todos atos de amor.
Os alicerces da confiança básica no mundo e em si mesmo estão na primeira infância e na adolescência. Através do amor, o ser humano experimenta o sentimento de existir, uma das maneiras mais eficazes de prevenir as doenças e de promover a saúde.
"
Luiz Fernando de Campos Velho, médico do programa de Saúde da Família

Muito apropriado esse texto. Concordo integralmente com ele. Assisto, com alguma frequência, a programas da tevê paga sobre famílias em crise que pedem apoio a babás profissionais - é sempre bom aprender com a experiência alheia. Observo que o problema mais comum não é exatamente falta de amor, mas falta de expressar esse amor.
Os pais têm dificuldade de elogiar os filhos, de lhes fazer um carinho físico, de acompanhar suas atividades de lazer, de sentar no chão com eles para brincar. E é fácil perceber que muias daquelas crianças brigonas, gritonas, que batem e destroem tudo e todos estão dizendo "mamãe, olha pra mim".
Mantenho-me alerta a isso. Para que não cometa com a minha filha esse tipo de pecado.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Progressos II

Nada como uma boa noite de sono, né! Aquela sensação de frustração já não me pertence mais.
Me dei conta de que minha filha não quer mais o meu leite pq ele já não é suficiente para suprir suas necessidades. Afinal, agora, ela brinca mais, se movimenta mais, está começando a se mexer para engatinhar, enfim, é superativa. Realmente, pensando bem, leitinho não dá conta.
Vou conversar com o pediatra dela pra ver que outras comidinhas posso dar. E encarar o fato de que, se ela não quiser mais leite, vou doar enquanto eu tiver e pronto. Sem sofrimento. Afinal, filhos não nos pertencem, não é?! São para o mundo. Mesmo.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Progressos

Estou bem chateada hoje. Acho que a Valentina está começando a largar o meu seio. Não esperava isso agora ainda, imaginei que fosse acontecer bem mais tarde, já que ela sempre mamou superbem, eu tenho bastante leite e sai bem fácil.

Há duas semanas, Valentina está na creche. Lá, come tri bem, tanto as frutas quanto as papinhas salgadas. Tenho ido amamentar às 13h e no fim da tarde, mas ela não me dá muita bola. Aí, fiquei com medo de meu leite secar antes dela desistir de mamar.

Qual não foi a minha surpresa ao perceber que, em casa, com fome, ela rejeitou o seio! E se fartou na papinha que eu preparei às pressas!

Mais tarde, antes de dormir, ela mamou. Até mamou bem. Mas acho que entendi o recado: seio da mamãe, agora, só para nanar. Matar a fome é com comida mesmo.

Como tudo que diz respeito a filho, é muito estranha essa sensação. Quero minha filhinha mais independente, mas estarei preparada para isso?! Bom, melhor me preparar, senão os progressos da minha gatinha me atropelam.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Por que ela sempre vem?!

E Valentina vai crescendo. Dois dias na escola bem comportadinha.
No segundo dia, ela passou pouco mais de 2h lá. Quando chegou em casa, peguei um brinquedo e coloquei-os, ela e o brinquedo, no carrinho. Aí, ela bateu. Quem?! A culpa.
Escutei aquela vozinha me dizendo "ela passa todo esse tempo longe e tu coloca no carrinho?! Que horror! Já pro colo!". Claro que a pessoa se sentiu a pior, mesmo que isso tudo tenha durado só, hum..., cinco segundos, talvez.
Achei a solução: chegar em casa é hora de brincar com a mamãe! Brincadeiras, risadas e muitos cheiros depois, foi batendo a preguicinha. Hora da moçoila se lavar e ir nanar.

(Bom, não foi bem assim. Valentina ainda acordou várias vezes, deu uma reinadinha e foi dormir, definitivamente, em torno de meia-noite, pra variar... Mas tudo bem, a gente se adapta à rotina.)

Que droga, por que esse sentimento besta e estéril que é a culpa sempre acaba aparecendo?! Ahhhhhh! Siiim, eu sou uma boa mãe!
Eu acho...

Um mundo novo - primeiro dia na escola

Visitas, conversas, reflexões. Ligações, escolhas, decisões.
Depois de visitar cinco creches, conversar com vários conhecidos, deu-se o veredito. E lá fomos nós.
Troca fralda, arruma a bolsa, pega toalhinha de boca, será que precisa mais um casaquinho? Acabo levando tudo - como eu ia saber do que ela precisaria para passar 1h lá?! Pega os documentos para a matrícula - comprovante de endereço, cópia da certidão de nascimento, RG da mamãe. Ai, falta o xerox da identidade do papai! Ok, tudo reunido, seguimos rumo à creche. Mostra a escola pro papai, apresenta as profes. Passo as orientações básicas sobre a moçoila e, enfim, a entrego nas mãos da jovem e sorridente professora.
Titubeio: Deus, que tenha sido a melhor escolha.
Pronto, minha gatinha está na escola.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Novas pessoas

A Valentina mudou completamente quem eu sou.
Olhos, ouvidos e nariz mais afiados do que nunca. Para ver qualquer diferença mínima na minha filha, para ouvir qualquer manifestação, mesmo a quilômetros de distância, e para identificar qualquer fralda suja!
Ela consegue, com um suspiro, o que minha mãe sempre penou para conseguir: me fazer pular da cama em um segundo! Apenas para ver que ela está bem, que dorme como um anjo. Aliás, nada dá mais paz do que vê-la dormir. O mundo pára. E nada mais importa.
Conhecer cada carinha que ela faz é uma delícia. Diferenciar o que cada choro significa é o desafio cotidiano e adorável. Mesmo diante da angústia que me toma quando não consigo acalmá-la ou sequer descobrir o que a perturba.
Nada é tão gostoso do que observar suas carinhas e trejeitos.
Saber que meu corpo a alimenta, que minhas mãos lhes dão segurança, que meu peito a acalma é experimentar um pouco do divino. A minha filha me desperta sensações que eu nem imaginei existirem. De alerta, de cuidado, de carinho, de paciência.
E eu amo muito tudo isso. Amo a minha filha. Amo a pessoa que ela me fez descobrir dentro de mim.

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